quinta-feira, 30 de novembro de 2006


Sísifo
(Coimbra, 27 de Dezembro de 1977)
Recomeça...
Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo
Ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar
E vendo,
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças.

domingo, 26 de novembro de 2006


Não dormi bem a noite toda. Virei-me infinitamente, de um lado para o outro, imaginando o encontro dos olhares há dois anos afastados. Uma dor de barriga moidora e caprichosa como eu já não me lembrava há muito tempo atrás, na altura da paixão e dos encontros furtuitos, da insconsciência e dos beijos recém-descobertos. Na altura de uma tarde intemporal numa praia do Sul ou das traseiras de uma pensão barata qualquer, com cheiro a erva e a geada de Outono.
Quando o vi no carro vermelho, porta semi-aberta, de óculos a taparem os olhos pelos quais me apaixonara há sete anos atrás, estremeci com os nervos à flor da pele.

Perguntou-me para onde íamos. Respondi-lhe que íamos andar sem destino e deixei-o conduzir o carro vermelho tal como lhe permiti ali, naquele dia e naquele instante, conduzir a minha vida. Rumamos em direcção ao Guincho mas enganei-me no caminho ao pé da Boca do Inferno e tivemos que dar a volta a Cascais. Parámos na Casa da Guia. Quando saiu do carro reparei que estavas com um pouco de barriga, mas a T-shirt preta justa e as calças de ganga evidenciavam a figura forte e máscula que tanto me seduzia.

Confessou-me a sua ansiedade nessa manhã, em que acordou só para me ver, ao escolher a roupa para vir ao meu encontro. Lisonjeou-me a preocupação estúpida com a roupa, só para me agradar. Sabe que o acho bonito. Sempre.

sexta-feira, 17 de novembro de 2006


A insatisfação nasce da crença cega na utopia”
Nietchze

“Ela (a utopia) está no horizonte,
Aproximo-me dois passos e ela
Afasta-se dois passos
Avanço dez passos e o horizonte
Distancia-se de mim dez passos;
Posso ir tão longe quanto quiser:
Nunca lá chegarei.
Para que serve então a utopia?
Para isso: para avançarmos.”

Se sonho com numa relação utópica, porque não avançamos nós?

quarta-feira, 1 de novembro de 2006


De qualquer modo, é importante para mim, reforçar que a nossa amizade tem valor por aquilo que é. Pela história que habita intacta e condensada na minha memória. Pelos seus momentos que pairam isolados, leves e selectos na tua. Ela deve permanecer intocável, observada e julgada pelos outros, mas capaz de mudar apenas sob a nossa acção. Preserva-a, também, se a consideras importante. E diz-me não, sempre consciente nos efeitos que o modo como mo dirás pode mudar tudo.
Mas não te confrontes comigo nem me pressiones. Porque isto que existe persistirá, na mesma, mesmo que só durasse há um segundo, o tempo de cair a última folha de um malmequer numa manhã fresca de fim de Verão.
Tenderá a persistir. Tudo. Sempre. Mesmo que um dia se apaguem os raios de sol, quando o confronto, finalmente, for tão intenso que ficará tudo tão sereno, tão plácido, tão silêncio e só restemos nós e o mar a bater nas rochas ao pé de uma cabana-bar...